Leonardo Lauri Carlini
Sou padre. Sim, sou um
padre. Miserável, débil e descrente, mas continuo sendo quem deve levar a
palavra de um deus em que eu desacreditei. Hoje, com meus trinta anos de idade,
olho pra trás e vejo que minha rotina sufocou toda a minha essência, minha
vontade de realizar os meus anseios, meus luxos, de gozar a vida.
Aos dezoito anos de
idade, após ter concluído o ensino médio, estava convicto de que minha vocação
seria junto à igreja. Minha família, católica, sempre me direcionou aos
caminhos do catolicismo, me fazendo crente em seu Deus. A partir daí, adentrei
em um seminário da região, com o intuito de seguir os dogmas passados pelos que
se dizem superiores em termos de fé.
Tento fazer uma
análise, vasculhar o meu interior e procurar por qual escombro de minha
fragilizada mente a minha fé se ocultou. O pouco que restava de minha sanidade
acabou sendo exterminada com um cotidiano que se resumia entre casa paroquial e
igrejas em que atendia.
Apesar de minha curta
carreira, milhares de confessos pecadores vieram a mim, com olhos frágeis e
coração partido, procurando um conforto em meio ao mundo avesso em que fomos
colocados. Entretanto, nenhum desses fiéis sabia que eu os desprezava, assim
como um insignificante lixo que não me dou o desfrute de juntá-lo. Na verdade,
meu real desejo era de cometer os seus pecados, deleitar-me das suas
imperfeições e aplicar tudo o que há de mal em mim.
Me dirijo ao confessionário, ansioso à espera da primeira pessoa em que irei, por fim, aventurar-me e brincar com a sua existência.
Volto neste momento de
uma viagem a uma capela interiorana. Venho matutando o percurso inteiro o
momento libertário. Estaciono meu carro aos fundos da igreja, pressentindo um
momento posterior. Me preparo, respiro e visto meu manto, que para muitos era
sagrado, mas, para mim, um simples manto que irei banhar com sangue de
pecadores. Me dirijo ao confessionário, ansioso à espera da primeira pessoa em
que irei, por fim, aventurar-me e brincar com a sua existência. Poucos minutos
depois chega um corpulento homem, com uma fisionomia abatida que começa a me
confessar algo relacionado a infidelidade com sua esposa. Dei de ombros a
todas as suas conversas e antes que ele me desse as costas, minha adaga,
pontiaguda e afiada, o perfurou com toda a minha energia contida durante anos.
Um banho de sangue,
quente e de um vermelho vivo me atingiu, antes que o cadáver fosse ao chão. Uma jovem mulher, que acabara de entrar na igreja
presenciou toda a cena. Por volta de vinte anos, pele branca, cabelo escuro e
um tanto quanto acima do peso, a moça tentou correr aos berros para fora.
Quanta prepotência... Nem bem chegou ao lado de fora, eu a alcancei, segurei-a
pelos meus braços e arrastei-a para dentro. Minha vontade era de matá-la
naquele exato momento, mas um lapso de lucidez me fez hesitar.
Um banho de sangue, quente e de um vermelho vivo me atingiu, antes que o cadáver fosse ao chão.
Com um murro na lateral
de sua cabeça, deixei-a desacordada, ao passo em que procurava cordas e mordaça
para deixá-la calada pelo tempo que fosse necessário. Minha astúcia levou-me a
improvisar uma maneira de atá-la com toalhas que estavam em uma das mesas da
matriz.
Imóvel, levei-a para o
carro. Coloquei seu corpo no banco ao meu lado. Jamais tinha visto tal mulher.
Minha abatida vida se transformava, da água para o vinho. Podia sentir uma
palpitação impressionante de algo tenebroso tomando conta do meu ser, mas isso era
algo bom, algo que eu tinha o anseio de conhecer. Acelerei. Não sabia para qual
destino iria me direcionar, nem o que faria com a mulher.
Só sabia que
estava viajando, imprevisível, desumano, vivendo a minha desumanidade, que
assustadoramente me fascinava.
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